LGPD nas farmácias: uso indevido de CPF e uso ilegal de dados
Por: Sarah Pereira
É comum, ao realizar uma compra em farmácias, que o atendente solicite o CPF do consumidor sob a justificativa de condicionar descontos. O que não é informado, porém, é que esse número abre um cadastro vinculado ao cliente, permitindo o armazenamento de dados pessoais e sensíveis sem os devidos esclarecimentos prévios. Tal prática viola diretamente o direito básico à informação assegurado ao consumidor, bem como a Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD.
O dever de informação e o CDC
Nos termos do artigo 6º, inciso III, do Código de Defesa do Consumidor, é direito do consumidor receber “informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem.”
Dessa forma, a conduta das farmácias que condicionam descontos à apresentação do CPF infringe diretamente esse dispositivo legal.
Caso prático
A Drogaria Araújo S/A foi condenada a pagar quase R$ 8 milhões por condicionar descontos ao fornecimento do CPF do consumidor no momento da compra, sem esclarecer a real finalidade do uso dessas informações.
Segundo o Ministério Público de Minas Gerais, a prática viola o direito à informação e expõe o consumidor ao risco de ter seus dados coletados e utilizados sem consentimento. E este não é um caso isolado: diversas farmácias adotam práticas semelhantes, de forma reiterada e abusiva.
Venda de dados para planos de saúde
Além de armazenar os dados, algumas farmácias utilizam essas informações para negociá-las com planos de saúde, que se interessam em conhecer os hábitos de consumo de seus clientes.
Esses dados podem servir de justificativa para reajustes de mensalidades, além de gerar riscos como negativas de cobertura, seguros ou indenizações.
Funcionamento abusivo da conduta
A situação revela a fragilidade no manuseio de dados pessoais. Há indícios de bancos de dados mantidos por até 15 anos, reunindo informações de milhões de consumidores e sendo repassados a empresas terceirizadas para fins de comercialização.
Na prática, o consumidor entrega seu CPF acreditando estar obtendo um desconto, mas, em muitos casos, tais benefícios sequer existem. O que se faz, de forma abusiva, é alimentar um banco de dados que vira produto de venda para terceiros.
O que pode estar no banco de dados das farmácias?
As informações coletadas variam desde dados superficiais até registros altamente pessoais, como: histórico de doenças crônicas, uso de medicamentos controlados, DSTs e doenças degenerativas, dados sobre saúde mental (como indícios de depressão ou ideação suicida), informações sobre vida sexual (como compra de preservativos, anticoncepcionais ou medicamentos para impotência).
Esses dados, portanto, são classificados como sensíveis pela legislação.