Desconsideração da personalidade jurídica: o ex-sócio poderá ser incluído no incidente para responder pelos débitos da empresa com seu patrimônio pessoal?
Por: Mariana Marin
Da desconsideração da personalidade jurídica
O artigo 50 do Código Civil vigente prevê a possibilidade da desconsideração da personalidade jurídica, instituto lançado para admitir a inclusão dos sócios no polo passivo de um processo, para que respondam com seu patrimônio pelas obrigações contraídas pela pessoa jurídica, nos casos de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial.
Permite-se, assim, o afastamento da barreira formal que separa a empresa de seus sócios.
Os bens dos sócios respondem pela dívida da sociedade?
A regra em nosso sistema jurídico é de que os bens dos sócios não respondem pelas dívidas da sociedade desde que sobre elas não existam dúvidas sobre a abusividade dos atos praticados. Ou seja, uma vez verificado o abuso de personalidade jurídica pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial da empresa, poderá ser instaurado o incidente de desconsideração da personalidade jurídica de modo a alcançar o patrimônio dos sócios.
Isto se justifica em razão de não ser razoável a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza.
Os ex-sócios poderão ser responsabilizados nos casos de abuso de personalidade jurídica?
Com o objetivo de proteger tanto os interesses sociais como os dos credores da pessoa jurídica, se constatado que o abuso de personalidade jurídica é anterior à retirada do sócio do quadro societário, este poderá ser incluído no incidente de desconsideração de personalidade jurídica, de modo que tanto o patrimônio do ex-sócio como o do sócio atual será atingido, respondendo ambos solidariamente pelo débito.
Da não aplicação do prazo de 02 anos previsto nos artigos 1.003 e 1.032 do Código Civil
Conforme explica a Ministra Nancy Andrighi do Superior Tribunal de Justiça, o prazo decadencial de 02 anos para responsabilização do ex-sócio, contados da data da averbação da alteração contratual da retirada do sócio, estabelecido pelos referidos artigos, restringe-se às obrigações que o cedente das cotas possuía na qualidade de sócio, decorrentes do contrato. Assim, não estão compreendidas na hipótese as obrigações de caráter subjetivo do sócio, resultantes do exercício de sua autonomia privada ou da prática de ato ilícito.
De tal forma, não se aplica referido prazo bienal quando se trata de obrigações que possam decorrer do uso indevido da pessoa jurídica para obter vantagens diretas ou indiretas, a fim de que seja estabelecida a responsabilidade daqueles que causam, com o abuso da personalidade jurídica, frustração aos credores que confiaram na força patrimonial da empresa, sob pena de se retirar a efetividade da desconsideração da personalidade jurídica.
Mariana Marin
Cursando Direito pela Universidade São Francisco de Bragança Paulista, com conclusão projetada para 12/2022.
Experiência na execução de tarefas administrativas relacionadas à rotina jurídica em escritório de advocacia, bem como no ramo bancário imobiliário.