ILEGALIDADE DO ICMS SOBRE AS TARIFAS TUST E TUSD DE ENERGIA ELÉTRICA
Por: HÉLLEN BEZERRA ANTONIO PETSCHELIES
A legalidade e a constitucionalidade da inclusão da Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) e da Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD) de energia elétrica na base de cálculo do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) é matéria bastante debatida e controvertida perante os Tribunais Estaduais, que aguarda julgamento definitivo perante os Tribunais Superiores – Supremo Tribunal Federal (STF) e Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Em verdade, muitos consumidores de energia elétrica têm buscado o Judiciário visando reduzir o valor do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) pago na fatura de energia a partir da retirada das chamadas tarifa de uso de transmissão e de distribuição do sistema (TUST e TUSD) da base de cálculo desse tributo, por ser ilegal a exigência, senão vejamos.
Segundo depreende-se dos termos do artigo 155, inciso II, § 3º, da Constituição Federal, que traz a regra matriz de incidência do ICMS, o fato gerador do imposto estadual se verifica apenas no momento em que a energia sai do estabelecimento do fornecedor e é efetivamente consumida, de modo que a tarifa cobrada nas fases anteriores a este momento não podem compor o valor da operação de saída da mercadoria, a qual será entregue ao consumidor.
É certo que a o termo “circulação”, para incidência do ICMS, pressupõe transferência da propriedade da mercadoria, assim, o ato que gera a incidência do ICMS é apenas a realização da circulação da “mercadoria” energia elétrica, ocorrendo o fato gerador no momento da saída da energia contratada da distribuidora para o estabelecimento consumidor. Esse entendimento também encontra previsão no artigo 2º, § 1º, inciso III, e artigo 12, incisos I e XII, todos da Lei Complementar 87/1996 (Lei Kandir).
Verifica-se assim que, em consonância com a Constituição Federal e Lei Kandir, apenas o preço da operação de fornecimento de energia elétrica poderá integrar a base de cálculo do ICMS -energia.
Todavia, ocorre que entes estatais têm cobrado o ICMS sobre as tarifas de uso do sistema de transmissão e de distribuição (TUST e TUSD), dando início ao debate jurídico sobre a legalidade ou não dessa base de cálculo, ensejando o necessário ajuizamento de ação competente para repelir a exigência indevida.
Ao julgar o tema, os Tribunais Estaduais não têm adotado um posicionamento pacífico, havendo bastante divergência de entendimento sobre a questão. No âmbito dos Tribunais Superiores, o posicionamento majoritário das Turmas do Superior Tribunal de Justiça (STJ) é no sentido de que o ICMS não deve incidir sobre a TUSD da conta de energia elétrica.
É certo que o entendimento do STJ quanto a não incidência do ICMS sobre as tarifas é decorrente do fato gerador do imposto estadual se verificar apenas no momento em que a energia sai do estabelecimento do fornecedor e é efetivamente consumida e, assim, a tarifa cobrada nas fases anteriores a este momento não podem compor a base de cálculo do imposto, conforme supra arguido.
Entretanto, na contramão de um esclarecimento definitivo, contrariando o entendimento já consolidado no órgão julgador e ignorando os precedentes estabelecidos pelas Súmulas 166 e 391 do STJ, a 1ª Turma do Egrégio Superior Tribunal de Justiça decidiu pela legalidade da incidência do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços nas parcelas estranhas à remuneração da energia elétrica, Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição – TUSD e Tarifa do Uso do Sistema de Transmissão – TUST.
Neste diapasão, cabe trazer o teor das Súmulas que embasam o entendimento do STJ quanto à ilegalidade da inclusão da TUSD e TUST n base de cálculo do ICMS:
- Súmula 391 – STJ: “O ICMS incide sobre o valor da tarifa de energia elétrica correspondente à demanda de potência efetivamente utilizada”.
- Súmula 166 – STJ: “Não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte.”
Assim, a citada decisão da 1ª Turma do Egrégio Superior Tribunal de Justiça deflagra repentina mudança de entendimento do órgão julgador, bem como ainda determinou a suspensão de todos os processos no território nacional, para que o tema seja julgado sob o regime dos recursos repetitivos, causando grande preocupação aos contribuintes.
Segundo o entendimento da 1ª Turma do STJ, a legalidade da incidência do ICMS reside no argumento da indivisibilidade, eis que segundo o julgamento não é possível fazer a divisão de etapas do fornecimento de energia para fins de incidência do ICMS; nos moldes de cobrança do imposto, já que a incidência do ICMS sobre todo o processo de fornecimento de energia é a regra para o consumidor simples; e, principalmente, no impacto financeiro que a exclusão da TUSD da base de cálculo do ICMS causará nas finanças Estaduais.
Felizmente, após o julgamento supracitado, a Segunda Turma do Egrégio Superior de Justiça já se posicionou pela ilegalidade da incidência das tarifas no ICMS da energia elétrica, demonstrando, assim, que o tema ainda não foi definido perante o órgão julgador.
Destarte, denota-se que o Tribunal não mudou o seu entendimento, tampouco pacificou a questão, tendo sido apenas um julgamento isolado. Ademais, o STJ decidiu que serão julgados como repetitivos três recursos sobre o tema: o REsp 1.692.023, o REsp 1.699.851 e o EREsp 1.163.020.
Outrossim, o Egrégio Supremo Tribunal Federal ainda não se manifestou sobre a discussão e a matéria aguarda julgamento do RE 593.824-7/SC, no qual foi reconhecida a repercussão geral do tema que trata da cobrança do ICMS sobre os valores devidos a título de Tarifas de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) ou Distribuição (TUSD).
Diante de todo o exposto, face à flagrante ilegalidade e inconstitucionalidade da inclusão da TUD e TUST na base de cálculo do ICMS, aguarda-se que o tema seja julgado de acordo com o disposto no ordenamento jurídico pátrio vigente, pois nesse cenário será confirmada a aplicação das Súmulas 166 e 391 do STJ.
Finalmente, cabe frisar que todos os consumidores podem pleitear judicialmente a exclusão de maneira definitiva da TUST e TUSD (e dos encargos) da base de cálculo do ICMS relativo às operações de consumo de energia elétrica, bem como a restituição dos valores cobrados indevidamente nos últimos 05 (cinco) anos (contados do ajuizamento), eis que a matéria ainda se encontra em debate nos Tribunais Superiores e a legislação ampara o direito almejado.
HÉLLEN BEZERRA ANTONIO PETSCHELIES
É sócia-fundadora do Bezerra Gonçalves. Advogada atuante de forma abrangente em questões jurídicas atinentes às empresas brasileiras, principalmente nas áreas tributária, empresarial e contratual. Especialista em Direito Tributário, tem mais de 08 anos de atuação, atendendo a clientes de todos os portes, com ênfase em contencioso e planejamento tributário. Construiu parte de sua carreira em escritórios de grande porte, onde atuou como advogada contenciosa.