Acompanhamento de filho deficiente é hipótese de redução de jornada de trabalho?
Por: Laura Gomes
O tratamento de deficiências em um contexto geral demanda tempo não só da pessoa com deficiência, mas também de seu respectivo cuidador. As terapias e consultas são elementos essenciais para o desenvolvimento individual da pessoa com deficiência e devem ocorrer dentro da periodicidade recomendada por profissionais da saúde. Porém, é notório que grande parcela dos genitores são cuidadores dos seus filhos e se dividem entre desempenhar este papel e o exercício de sua profissão, que por sua vez é responsável por prover o sustento e dignidade do núcleo familiar.
Entretanto, torna-se impossível para os familiares manejar o tempo entre seu trabalho e para acompanhar seus filhos durante os tratamentos necessários, para tanto, muitas vezes a redução da jornada de trabalho apresenta-se como a única solução possível para este impasse.
Neste sentido, em 2020, a 2ª Vara do Trabalho de Cotia/SP concedeu a uma bancária o direito a ter sua jornada de trabalho reduzida para quatro horas diárias, de forma com que não houvesse redução de salário ou necessidade de compensação de horas. Nesta decisão, diante da ausência de previsão de redução de jornada nestes termos na Consolidação das Leis do Trabalho, o magistrado embasou-se na Convenção Internacional sobre o Direito das Pessoas com Deficiência, a qual garante ampla proteção aos direitos da pessoa com deficiência e nos laudos médicos acostados pela autora.
Recentemente, a 55ª Vara do Trabalho de São Paulo proferiu decisão semelhante e concedeu a uma enfermeira funcionária do Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual de São Paulo a redução de sua jornada de trabalho semanal de trinta horas para quinze horas para que esta possa acompanhar seu filho deficiente em seus tratamentos médicos.
Diante da alegação do empregador de que não há legislação vigente que determine a redução salarial sem consequente redução salarial, o Juiz do Trabalho que apreciou o caso destacou a garantia constitucional de proteção à dignidade humana, da saúde, da vida e sobretudo da criança e do núcleo familiar, afastando então a alegação de necessidade de previsão legal e de avaliação de junta médica para conceção da redução da jornada de trabalho.
As decisões citadas anteriormente neste artigo demonstram a importância da proteção dos direitos e interesses das pessoas com deficiência, de forma com que seu desenvolvimento não seja comprometido por decisões não humanizadas que se limitam a alegar a ausência de previsão legal para tanto. Estas decisões simbolizam grande progresso para as pessoas com deficiência e para seus familiares, possibilitando melhor qualidade de vida não só para o indivíduo, mas para todo o seu núcleo familiar.
LAURA GOMES
Cursando Direito pela Universidade São Francisco desde janeiro de 2019 e com finalização prevista para dezembro de 2023.
Experiência no ramo do direito público, atuando como auxiliar em processos judiciais e administrativos na Secretaria de Assuntos Jurídicos da Prefeitura de Bragança Paulista.